uma vida sobre rodas
Ele só consegue recordar-se do antes e do depois, o durante foi apagado da memória, dizem que é apenas uma forma de defesa do seu organismo, que se esquecer aquele choque vai ser melhor para si.
Ela leva-o para casa e instintivamente dirigem-se à varanda. Nenhum deles precisou de dizer uma palavra, ela sabia que era ali que ele mais gostava de estar e ele sabia que não precisava de lho pedir para que ela soubesse que o queria.
Viu-o fechar os olhos, percebeu que inspirva profundamente a brisa marítima...
Quem me dera poder dizer-lhe o que estou a sentir, mostrar-lhe o quanto tudo isto me faz feliz, o quanto ela me faz feliz! Maldito acidente! Ainda posso ver o mar, ainda posso ver o seu rosto mas... será que algum dia vou voltar a poder dizer-lhe que a amo? Sei melhor que ninguém a resposta a esta pergunta... O meu corpo jamais me deixará voltar a pronunciar tal palavra... ou qualquer outra. Não voltarei a sentir o salgado do mar quando estivermos a brincar nas ondas, não voltarei a correr na areia, não mais ralharei com ela, obrigando-a a deixar-me pôr protector solar, não voltarei a vestir uns calções de banho, não terei nunca mais aquela pele bronzeada que me concedia aquele ar de surfista... E ela? Que fará ela?
- Meu querido, sei que me ouves, os médicos garantiram-me que sim. Só não sei se terás ainda discernimento para entender tudo aquilo que pretendo dizer-te, mas mesmo que não percebas, sei que vais sentir. - pegou-lhe na mão - Quero que saibas que jamais te abandonarei, jamais te porei de parte seja em que situação for, quero que saibas que te amo como sempre amei e que continuo a ter um enorme orgulho em ti. Todas as manhãs te trarei até aqui, poderás ver a praia, o céu azul, as ondas a quase engolirem os rochedos, a areia branca... Continuarás a ser a minha metade, a alma que me completa e me ampara em todas as ocasiões. E eu continuarei a estar aqui para tudo, mas ainda mais presente. Tratarei de ti melhor do que nunca, falarei contigo sobre tudo, como sempre fiz e, mais uma vez te digo, continuarei a amar-te. Tu és o homem da minha vida e quem ocupa esse posto não sai nunca mais. Sê forte! Não deixes que nada nem ninguém te leve, porque eu não sei viver sem ti.
E foi neste momento que viu uma lágrima correr-lhe pelo rosto, percebeu que ele ouvira tudo e, mais, percebera tudo. Só foi capaz de sorrir!
Só queria poder mexer os lábios e dizer-te que te amo. Eu não sei se sei viver assim...
Ela nunca soube o que lhe ia na alma. Anos a fio fez tudo o que lhe prometera, sem esforço, sem obrigações. Até ao dia em que foi traida pelo destino. Levara-o à varanda, como todos os dias fazia, mas naquela manhã, deixou-o sozinho uns minutos, apena o tempo que demorou a ir buscar uma manta para o aquecer, e quando voltou a cadeira estava vazia, aproximou-se da grade e viu-o esmagado no chão. Ao fim de tanto tempo, conseguira mexer-se. Mas fica a dúvida: será que caiu ou ter-se-à atirado?
Comentários
Vou seguir : D
Cumprimentos, Filipa Teixeira.
Noutro aspecto, acho que se combinam tão bem... Eu de uma imagem posso fazer um texto e, de um texto, posso criar uma imagem, como o mesmo amor.
Às vezes até me sinto, "sei lá", muitas vezes as palavras invejosas corroem toda a réstia de esperança e entusiasmo que levamos no coração.
Eu estendo-me tanto, que vergonha! Desculpa, mas é inevitável (x