conversa de isqueiro
Sento-me na primeira mesa que encontro livre. Na
verdade, há muito tempo que não venho cá. Só gosto disto quando está sol.
Avisto o senhor de camisa branca. «Uma água, por favor». Isto hoje está mais
vazio que o habitual, pensei. Vejo na outra ponta da esplanada um gin tónico em cima da mesa, em torno
dele uma mão cansada de sol. Eu nem sou destas coisas, mas aproximei-me.
Sentei-me sem pedir autorização e bebi a minha água, em silêncio, enquanto tu
continuavas de olhos baixos. Abri o meu SG
Ventil, ofereci-te um cigarro que recusaste com um abanar da cabeça. Também
não fumei. Olhaste-me, pela primeira vez. «Sou o João». Assim, seco, sem
emoção. Esperei que continuasses. Não o fizeste. «Sou a Margarida». Os teus
olhos voltaram a levantar-se, desta vez para o empregado, «Mais um».
E, como se uma rolha tivesse saltado, espingardeaste:
«Com o Mário? Com o Mário?! Ele é meu irmão. Eu amo-o. E amo-a! Fico de mãos e
pés atados, não posso bater-lhe, é meu irmão. Assisto, impávido e sereno? Que é
que eu faço?». Percebi. «Há dias em que o gin
é a melhor companhia, não é?», balbuciei. Nunca fui de grandes palavras e ainda
menos quando não sei o que dizer. Fico calada. Desta vez baixo eu os olhos.
Sinal de respeito? De pesar? De compaixão? Retomaste, «O gim é fiel, pelo menos.» e esboçaste um sorriso de cansaço. Bebeste
o último gole. Fechaste os olhos. Respiraste fundo. Olhaste-me. Sorriste.
«Obrigado!» (pela companhia, suponho). «A caneta é tua, o papel também, escreve
tu o teu final», pisquei o olho. Levantei-me. E deixei-te entregue a ti
próprio.
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