(10) O teu sabor
Sentei-me no sofá. Uma, duas,
três colheres de iogurte de pêssego. Já não estou ali. Fui transportado para
o dia em que conheci este sabor. O teu sabor. O pêssego do teu batom.
Foi na faculdade. Depois da nossa aula de desenho, escapei-me para a
esplanada do bar. Sentei-me naquela mesa do canto e tirei um cigarro. Dois
minutos depois, apareces tu. Fizeste questão de ficar no outro canto da esplanada. Fiz de conta que não sabia o teu nome. Fizeste de conta que nunca me tinhas visto. Fiz
de conta que não sabias quem
eu era. Fizeste de conta que não conhecias o
meu perfume. Fiz de conta que jamais te tinha tocado. Fizemos de conta que não nos amávamos.
Enquanto eu bafejava o meu cigarro, cruzaste um desafiante olhar.
Respondi com um sorriso e o plano estava feito. Eu já sabia o que fazer quando matasse o cigarro.
Fugi dali em direção às casas de banho. Aqueles 20
metros que distanciavam a esplanada do corredor pareciam infinitos. Pareciam
meses a dar a volta ao mundo. Cada passo era uma batalha travada. Revolução Francesa. Deserto do Saara. Batalha Alcácer-Quibir. Monte Fugi. Iraque.
E de repente, “alguém” me puxa
para o WC. Sem tempo para reagir, mal te olhei, mal te toquei. Beijamo-nos. O
doce dos teus lábios. O pêssego do teu batom.
por Tiago Pereira
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