Dia 19 - LISTAR

Listar: pôr em cardápio.

Estamos a mais de metade do último mês do ano. Estamos a 5 dias do Natal. Estamos a 12 dias de 2016. Quantos planos de 2015 ficaram por cumprir? Quantas pessoas ficaram pelo caminho? Quanto de ti se apagou? Às vezes acho que devíamos ter uma conversa com o nosso passado, intimidá-lo, obrigá-lo a dizer porque nos deixou, porque não se manteve. Depois acho que é estupidez, que devíamos era ter uma conversa com o nosso futuro, intimidá-lo, ameaçá-lo, dizer-lhe o que queremos, o que esperamos e que não nos desiluda se não partimos-lhe as duas pernas e damos-lhe um sorriso igual ao do Tiririca. Se calhar não devíamos falar com o nosso futuro mas com o nosso “eu” do futuro. Gostava de lhe explicar que agora sou só isto mas que quero que o tempo o ajude a ser mais, a ser melhor, que quero que se ame por inteiro, que seja completo e que tenha uma vida cheia de pessoas que se adorem. Queria dizer-lhe quais são os meus sonhos e que espero que por altura do nosso contacto, ele já o tenha cumprido.
Nunca fui alguém a quem faltassem sonhos. Nunca aspirei a era em que se venderão sonhos engarrafados. Mas podia engarrafar os meus. Escrevê-los em papiro velho e  queimado. Fazer deles canudos. Atá-los com ráfia e metê-los em garrafas. O que fazia com as garrafas? Podia colocá-las em exposição numa qualquer prateleira da sala, deixar que qualquer estranho os cobiçasse para no final poder dizer, orgulhosa, que são meus, que fui eu que os idealizei, que saíram da minha cabeça e do meu coração, que vivo deles e para os cumprir. Mas acho que preferia atirá-las ao mar, esperar que ganhassem vida própria, que atravessassem o oceano para serem sonhos de outro alguém. Gostava que alguém pudesse abri-las, desatasse o nó que tão cuidadosamente fiz na ráfia, desenrolasse o canudo de papiro e o lesse. Que pudesse ver nos meus sonhos um rumo para a sua desorientação e que os pusesse em prática.

O bom de engarrafar sonhos é que o vácuo os torna imutáveis, não os deixa fugir e sempre que nos distrairmos, aquele verde-garrafa-de-tinto vai chamar-nos a atenção. Não vale a pena atribuir uma ordem às garrafas, no momento certo, a rolha vai saltar, bater no teto e pedir palmas. Hoje é dia de ir à garrafeira.

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